-Vejamos uma entrevista feita com poeta:
1-Como você começou a gostar de poesia?
Comecei a escrever poesia em 1991, com mais ou menos onze ou doze anos. Alguns ‘acontecimentos’ fizeram com que isso acontecesse, embora seja difícil dimensionar a importância de cada um deles com exatidão.
Em primeiro lugar, um ano antes, cito a descoberta de que dos usos não pragmáticos da linguagem poderia ser extraído prazer (na leitura). Essa descoberta datada se deve ao fato de em 1990 eu ter começado a usar óculos (fato crucial para eu me aproximar da linguagem escrita, evidentemente) e, por conseqüência, tido as primeiras experiências de prazer com a leitura.
Em 1991, mudei-me pra Cabo Frio. Na Biblioteca Municipal dessa cidade, da qual logo me tornei um assíduo freqüentador por influência de meu avô materno, tomei de empréstimo livros de Drummond, Manuel Bandeira e Quintana, entre outros. Além disso, a chegada dos livros de minha mãe, que estiveram apartados de nós em 1990 e com os quais, pela primeira vez, estabeleci alguma relação (já que antes eu quase literalmente não os via) me serviu grande de estímulo.
Por fim, junto dos livros de minha mãe, chegaram escritos do meu pai (que também era poeta), os quais comecei a ler pela primeira vez naquele rico ano de 1991. Todos esses acontecimentos levaram-me a escrever meus primeiros (e ainda vacilantes e pueris) versos.
2-Quem incentivou você?
Todas as pessoas ao meu redor sempre me incentivaram. Acho que, pelo fato de meu pai ter sido poeta, as pessoas começaram a ver uma espécie de talento hereditário que se teria passado para mim. Eu mesmo, nos primeiros anos da descoberta dos meus (como já disse, ainda vacilantes e pueris) versos, desejava crer nisso, que era um forte incentivo para continuar escrevendo.
3-Que tipo de poesia você mais gosta e prefere fazer?
Eu confesso ter muita dificuldade pra responder esse tipo de questão. Em primeiro lugar, porque não sei o que exatamente significa ‘tipo de poesia’. Não sei se pela palavra ‘tipo’ se tem em mente filiação a algum tipo de escola literária (o que me parece uma coisa quase extinta atualmente, já que a arte perdeu muitos, quiçá todos seus paradigmas estéticos e os artistas hoje tateiam releituras ou reconstruções sem absolutos e padrões estabelecidos). Se ‘tipo de poesia’ significa algo como escola ou movimento literário, enquadro-me entre os poetas (e artistas) que tateiam entre o que foi e o que há hoje, sem ter consciência do que são. Talvez só no futuro um historiador da arte (ou da literatura) tenha, olhando em perspectiva, essa resposta. A única coisa de positiva que afirmo em relação a isso é que do modernismo, que tinha o objetivo de destruir estéticas e padrões, eu me afasto pela razão (quase óbvia) de não possuir padrões e estéticas pra destruir...
Se ‘tipo de poesia’, nessa pergunta, quer significar temática, ainda assim vejo-me incapaz de respondê-la com exatidão. Somente um estudo analítico consegue descortinar o universo temático de um autor, embora, claro, o autor tenha noções de que temas ele prefira ou trate. Assim, sem ser exato nem preciso, diria que metalinguagem e filosofia estão presentes em minha poesia. Gosto de enveredar pelas indagações sobre os limites do que pode ser dito, pelo espanto diante do fato inexorável de haver mundo, quando nada poderia haver (e do espanto, segundo uma definição socrática, nasce a filosofia) e pela experiência da própria finitude (do saber e do que sou), o que, segundo Heidegger, levaria o homem à filosofia. Além desses temas, o tema amoroso orbita meus poemas, como acontece com quase todos os poetas.
4-Qual o seu estilo de fazer poesia, ou seja, qual o modo em que você faz a poesia?
É difícil descrever o modo pelo qual se faz um poema. Aliás, é curioso o processo criativo! Ele surge sem ser esperado, vai-se tornando cada vez mais presente, mais freqüente, mais constante... Acho que para escrever, duas atividades são essenciais: observar e gerar. A observação nos dá a matéria-prima, o fundamento que o poeta orna de palavras. E a gestação é o trabalho pelo qual o poeta fecunda suas idéias – frutos da observação do mundo – e engendra seus poemas. Essa é a forma mais próxima de descrever o meu processo criativo, claro que um tanto superficialmente.
5-O que representa ser poeta para você?
Sentir junto, compartilhar o passional... Extrair o que há de belo no mundo e devolver ao mundo uma nova elaboração personalíssima dessa beleza. Ou, talvez, apenas uma forma de trabalhar as afecções e os perceptos.
6-O que representa a poesia para você?
Um dos inumeráveis veículos da beleza. Ou melhor, uma de suas incontáveis moradas.
7-Quais os grandes ícones da poesia brasileira e mundial que agradam mais você?
Dos que mais gosto de ler, enumero Quintana, Pessoa e Drummond. Mas há tantos outros que me tocaram, e creio que muitos outros que me tocarão.
Um prosador que faz pulsar poesia em seus escritos, e que não poderia de forma alguma omitir aqui, é Guimarães Rosa, autor das páginas mais tocantes que até hoje tive a oportunidade de ler.
8-Você já participou de recitais de poesia? Se participou cite alguns de grande importância?
Já participei de muitos recitais. Grande parte deles, na própria faculdade, sendo que num deles, recitei alguns poemas meus no Teatro de Arena do campus da Praia Vermelha, na UFRJ. Além desse, houve vários na própria Escola de Comunicação. Aliás, foi a partir da idéia de fazer um recital de poemas que escrevi um poema híbrido com a dramaturgia, o ‘Memorial dos Quatro Cantos’, concebido como um desafio entre poetas e duas vezes lido/encenado na própria Escola de Comunicação da UFRJ.
O último recital do qual participei foi num evento na Procuradoria da República em Minas Gerais, em que, além de recitar poemas de Vinícius de Moraes, também cantei algumas músicas, acompanhado por violões.
9-Qual a sua visão sobre a cultura principalmente no campo da literatura?
No entanto, mesmo no Brasil, julgo que a eclosão dos meios de comunicação de massa (jornais, revistas, entre outros) e a internet nos dão um panorama de leitores proporcionalmente muito maior do que em qualquer outra época de nossa história (no século XIX, a quantidade de analfabetos no Brasil era consideravelmente maior do que a de hoje, e no século XV, no mundo inteiro, os analfabetos eram muito mais numerosos do que os alfabetizados). Esses aspectos tão claros são freqüentemente esquecidos, quando se fala do hábito de leitura da população e se afirma, precipitadamente, que os meios de comunicação de massa audiovisuais (rádio e televisão) fazem com que as pessoas hoje não leiam como antigamente, como se houvesse neste hipotético antigamente uma massa leitora real maior do que há hoje.
No campo da produção literária em si, as mudanças sem precedentes na cultura dos povos, introduzidas por inovações tecnológicas que proliferaram informações no mundo (e trouxeram os problemas do excesso de informação e da dificuldade de se guiar num mundo com tanto ruído) fizeram com que a arte literária deixasse de ser predominantemente auto-referente, como até o século XX sempre fora. A literatura do século XX bebe de fontes não-literárias, como o cinema, o rádio e a música popular, a televisão, entre outras, além de, na última década, pelo menos, a internet.
Mesmo com o panorama positivo de crescimento (em números absolutos) de leitores que a alfabetização em massa suscitou, paradoxalmente, os homens de letras, hoje, não são figuras centrais da cultura. Desconfio que isso se deva, em primeiro lugar, pela pluralidade de vozes que a cultura de massa faz surgir e, em segundo lugar, à perda de referências que os homens de letras e de artes de um modo geral sofreram no decorrer do século passado (ou o nosso breve século XX, como o chama o historiador Eric Hobsbawm).
Assim, não obstante as inúmeras contradições desse campo, não sou daqueles que alimentam uma visão pessimista da cultura atual, nem uma visão romântica de um passado que nunca houvera sido. As construções culturais são inerentes ao ser humano e talvez só estejam ameaçadas de extinção porque o próprio homem se ameaça extinguir com os excessos da própria cultura ‘técno-lógica’ de produção (e destruição) em massa.
10-Você já publicou algum livro? Se já, cite o nome dele e o ano em que foi publicado?
Hoje (01° de maio de 2007), enquanto respondo essas questões, não tenho ainda nenhum livro publicado. No entanto, tenho um no prelo (cujas primeiras provas terminei de revisar esta semana), que deverá ser publicado entre junho e julho deste ano. O nome dele é “Poemas para serem encenados”.
11-Você já fez algum projeto ou participou de algum em referência a poesia?
Já participei da Sociedade dos Poetas Vivos, idealizada pelo poeta Maurício Cardozo no início da década de 1990 (ou seja, logo que eu comecei a escrever poemas). Foi uma participação pequena, de acordo com as minhas parcas possibilidades de então. E, mesmo distante e graças a você, Rodrigo, posso dizer também que participo do POESIARTE, movimento poético do qual você é o vértice. Na faculdade, fazia parte de um grupo que se reunia semanalmente para ler poesias. Mas jamais elaborei qualquer projeto sobre poesia, acabei tomando parte desses que já existiam.
12-Qual a poesia sua em que você mais possui afeição?
Não sei se entendi bem a pergunta. Parece-me que você quer saber de que poesia minha eu mais gosto, ou a qual poesia minha eu tenho mais me afeiçôo. Asseguro não haver resposta para essa pergunta, pois há muitas das quais eu gosto bastante. Neste período em que estive revisando as primeiras provas do meu livro, encontrei muitos versos que eu sequer lembrava ter escrito, encontrei poemas que me impressionaram positivamente... O poema abaixo, que constará no meu primeiro livro, é um que cito bastante, por conter uma espécie de apresentação minha por meio de elementos fantasiados, imaginados, mesclados a elementos reais e concretos, como os meus sobrenomes. Embora não valha como resposta para a sua pergunta, ela vale como exemplo de uma poesia minha da qual gosto bastante.
Genealógico
Sou filho dos burgos,
mas não sou burguês.
Meus cantos são lusos,
não sou português.
Meu povo me aponta
safaris no corpo,
contrastes, afrontas
e um velho índio morto.
Entre hóstias e hostes
cravaram-me um Tostes
de algum povo ao léu.
Fugindo com fome,
meu último nome
chamou Daniel.
"Poesia...prazer livre dos grilhões do preconceito; a cada verso, um gozo que dessemina o sêmen fecundo do pensamento." - Teófilo Tostes Daniel. (Trecho do livro "Poemas para serem encendados).
- Entrevista feita por Rodrigo Octavio Pereira de Andrade. (Rodrigo Poeta)
Um comentário:
Acho muito importante essa iniciativa de mostrar os poetas que existem nesse Brasil.
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